Inflação. De onde vem e como lidar com ela?

23.11.2022

Escrito por: Ideias que Contam

Compreender o que é e que impactos tem a taxa de inflação é, por estes dias, essencial para saber como agir numa altura em que os preços sobem. Neste guia explicativo, respondemos às questões que importam e sugerimos caminhos para minimizar os seus efeitos na carteira.

Pouco a pouco, a taxa de inflação tem vindo a subir em Portugal desde 2021, ano em que terminou em 1,3%. Mas foi já este ano que o cenário mudou e se formou aquilo que muitos economistas têm considerado uma tempestade perfeita – os efeitos acumulados da pandemia, o regresso da guerra à Europa e a política económica do Banco Central Europeu na última década são ingredientes que contribuíram para que a inflação tenha batido, em outubro, o patamar dos 10,1%. A origem é complexa, assim como as consequências são variadas e difíceis de controlar no imediato. Neste artigo, vamos procurar responder a algumas das principais dúvidas em torno deste chavão económico para perceber de onde vem, como funciona e, sobretudo, que impactos pode ter nas nossas vidas. 

 

 

O que é a inflação?

Em poucas palavras, a inflação traduz-se no aumento generalizado de preços de bens e serviços na economia. Não se pode dizer que exista inflação quando, por exemplo, o custo de um corte de cabelo aumenta de 15 euros para 20 euros se esta subida de preço for isolada e não se verificar, de forma geral, no valor cobrado por outros bens e serviços. Na prática, significa que, num cenário de inflação, uma nota de 10 euros compra menos produtos hoje do que permitia comprar há um ano. A longo prazo, a moeda vai perdendo valor e com ela desce também o poder de compra de cada consumidor. 

Nos manuais, a taxa é encarada como tendo quatro formas possíveis. A moderada ou deslizante, que acontece quando se verifica uma subida lenta dos preços abaixo dos 3%; a trotante quando o aumento ultrapassa os 3%; a galopante quando supera os 10%; e a hiperinflação, mais rara nas economias desenvolvidas e a mais temida, já que significa que os preços sobem mais de 50%.

Como é medida?

Mas se existem milhões de produtos e serviços diferentes, com custos variados, e vivemos numa economia aberta, sujeita a variações de preço, como é que conseguimos aferir a taxa de inflação em cada momento? Para resolver este problema foi criado o Índice Harmonizado de Preços no Consumidor (IHPC) que mais não é do que uma fórmula para calcular a taxa em cada país.

Este índice cria uma lista de categorias de bens e serviços, como a alimentação, as bebidas, a habitação ou a educação, por exemplo. De seguida, e porque cada um de nós gasta o seu dinheiro de forma diferente, é necessário atribuir um peso a cada uma destas categorias. Isso é feito tendo em conta as diferentes realidades dos países – enquanto em Portugal o peso do bacalhau nos gastos dos consumidores é superior ao de Espanha, em Espanha a importância do peixe é superior à verificada na Alemanha. 

A partir daqui é preciso seguir três passos. Se quisermos avaliar a inflação entre janeiro de 2020 (index-base de 100) e janeiro de 2021, podemos comparar o aumento do custo de cinco carcaças que passou de, imaginemos, 1 euro para 1,50 euros – isto significaria uma subida de 50%, ou seja, um index de 150. O segundo passo é repetir este processo em cada uma das categorias para aferir o index de preço em cada uma. Por fim, o terceiro passo é calcular os aumentos com base no peso que cada uma das categorias tem numa determinada economia. E é assim que se chega ao valor da inflação.

De onde vem a inflação que vivemos?

Os dados provisórios do Instituto Nacional de Estatística sobre a taxa de inflação em Portugal são claros: em outubro, a inflação fixou-se em 10,1%, a mais alta das últimas três décadas. Se recorrermos ao IHPC, utilizado para as comparações na Zona Euro, o Eurostat estabelece 10,6% de inflação em Portugal em outubro, abaixo dos 10,7% da média registada nos 19 países que partilham a moeda na Europa. À frente da tabela estão países como a Estónia (22,4%), Lituânia (22%) e Letónia (21,8%). 

A subida da inflação acontece, sobretudo, devido a três fatores – quando existe mais dinheiro na economia do que os consumidores querem gastar, quando aumentam os custos de matérias-primas e de produção; e pela lei da oferta e da procura. Em Portugal e na União Europeia, foram estes os três ingredientes que formaram a tal tempestade perfeita. 

Desde logo pelo referido excesso de dinheiro na economia, que tem origem nos apoios financeiros dados durante o período da pandemia (por exemplo, com a compra de dívida nacional pelo Banco Central Europeu). Adicionalmente, as ruturas nas cadeias de abastecimento que se verificaram com o embate da pandemia – que obrigou à interrupção da produção em muitos países europeus e asiáticos, de onde chegam muitos dos produtos – foram agravadas, no início deste ano, com a chegada da guerra à Ucrânia. Novamente, as cadeias de abastecimento foram prejudicadas e isso tem um impacto direto nos preços dos bens e serviços. 

Por último, o aumento dos custos de produção que deriva também da crise energética que se agravou na Europa à boleia da guerra. Se o preço da energia aumenta, os produtos e serviços que são produzidos a partir dela aumentam também. Basta olhar para os preços do gás natural em Portugal – numa fatura doméstica média, o custo total deverá subir, já em outubro, entre 6 e 30 euros, consoante os fornecedores. 

Impacto na carteira e na economia

 

 


Como já vimos, os impactos na economia são muitos e têm efeito dominó. Mas entre os principais para as empresas e para as famílias estão os custos com a energia e com empréstimos. No caso da prestação da casa, a subida da taxa de juros desencadeada pelo Banco Central Europeu leva a que, neste momento, a taxa de juros esteja fixada em 2%, valor que não só aumenta a pressão na economia europeia, como tem consequência direta no aumento de encargos com empréstimos bancários. 

E porque os créditos à habitação estão normalmente associados à taxa da Euribor a três, seis ou 12 meses, a prestação sobe à medida que a Euribor aumenta. Num crédito à habitação com spread de 1%, Euribor a seis meses e um prazo de 30 anos, quem tenha pedido 100 mil euros ao banco deverá ver a sua mensalidade subir em, pelo menos, 60 euros até ao final do ano. Em empréstimos de 200 mil euros, com as mesmas condições já referidas, o aumento pode chegar aos 120 euros por mês. 

Importa, por isso, agir preventivamente e fazer as contas. Se perceber que estes aumentos serão difíceis de suportar pelo seu rendimento mensal, o ideal será procurar falar com o seu banco e tentar encontrar uma solução que evite o incumprimento. Pode fazer as contas ajustadas ao seu caso em concreto através desta calculadora.

Mas porque em tempos de instabilidade financeira todos os cêntimos contam, existem várias opções para quem quer poupar ao máximo. Com o aumento do preço do gás natural, que pode atingir os 30 euros mensais para consumidores médios, o regresso ao mercado regulado, com preços máximos definidos pela Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), deve ser um cenário a considerar. O primeiro passo é olhar para a sua fatura e procurar o valor killowatt/hora (kWh) e confirmar se o seu atual fornecedor atualizou o preço a 1 de outubro – os aumentos médios variam entre 6 e 30 euros, consoante o operador. Caso faça sentido mudar para o mercado regulado, terá de optar por um dos vários Comercializadores de Último Recurso (CUR), cuja lista pode consultar aqui

Para que este processo corra da melhor forma possível, o ideal será consultar o guia passo a passo disponibilizado pela ERSE, que esclarece todas as dúvidas que possam surgir e sugere como deve atuar. 

Nas restantes contas domésticas deverá fazer o mesmo – analisar as suas faturas e procurar no mercado alternativas mais competitivas. No caso dos serviços de telecomunicações, poderá verificar se os pacotes de comunicações que subscreveu se adequam às suas necessidades e disponibilidade financeira e, mais uma vez, renegociar com o seu operador ou procurar melhores alternativas. 

Vale ainda a pena referir que é possível maximizar as poupanças em duas rubricas do orçamento familiar que mais pesam na carteira: as compras domésticas e o abastecimento de veículos. Além de poder economizar através da escolha dos chamados produtos de marca branca, deve considerar a utilização de cartões de fidelização disponíveis nas grandes superfícies. Estes cartões dão acesso a preços exclusivos que podem reduzir a fatura com descontos imediatos entre 5% e 10% ou, em alguns casos, a acumulação de pontos ou saldo em cartão que poderá utilizar em compras futuras. 

No caso do combustível, as opções são semelhantes. Algumas marcas oferecem descontos no preço por litro através de cartão de fidelização ou talões promocionais em parceria com redes de hipermercados – dependendo da situação, poderá conseguir alcançar poupanças que podem chegar aos 9 cêntimos por litro. O ideal será analisar os seus hábitos de consumo e procurar saber junto de hipermercados e postos de combustível quais são os cartões ou ofertas disponíveis e quais se adequam melhor à sua realidade.