Natal em Portugal: viagem pelas tradições mais emblemáticas

Natal em Portugal: viagem pelas tradições mais emblemáticas

22.12.2023

Escrito por: Ideias que Contam

Momento de união, partilha e esperança, esta é uma época em que as famílias se reúnem para celebrar o nascimento de Jesus Cristo, cumprindo rituais seculares de origem religiosa, de inspiração pagã ou que emergiram de certas iniciativas populares que se tornaram costumeiras. Conheça algumas das tradições vividas no Natal e no Ano Novo.

O Natal é uma das mais importantes celebrações religiosas do mundo, sendo comemorado pela maioria dos cristãos a 25 de dezembro. Em Portugal, a quadra é de grande alegria e festa, com muitas tradições e costumes que se mantêm há séculos. Saiba mais sobre alguns símbolos natalícios mais emblemáticos.

Árvore de Natal

Há quem diga que a história da Árvore de Natal começou na Letónia, em 1510, outros consideram que foi na Alemanha, em 1530, com Martinho Lutero. A Portugal terá chegado pela mão de D. Fernando II, duque de Saxe-Coburgo-Gotha e rei consorte (rainha D. Maria II), para recordar a tradição de Natal da sua infância passada em terras germânicas. Instalou-a e enfeitou-a com velas, laços e bolas de vidro transparente no Paço Real das Necessidades, em Lisboa, por volta de 1844. Nos primeiros tempos, o pinheiro de Natal, ou abeto, era pequeno e só se montava no dia 24 de dezembro, sendo decoração para a noite de Consoada. Entretanto, a sua popularidade foi crescendo significativamente ao longo do tempo e foi-se adaptando à cultura portuguesa.

Tradições Natal

A árvore de Natal simboliza a vida, a gratidão, a paz e a alegria. Ao ser decorada com luzes, enfeites multicolores e presentes, as famílias celebram a união, a generosidade e a exultação que caracterizam a época natalícia.
Mais recentemente, a escolha de pinheiros artificiais para a Árvore de Natal tem vindo a sobrepor-se à tradição dos pinheiros naturais. Em primeiro lugar, pela praticidade e durabilidade, em segundo porque permitem a reutilização ao longo dos anos. Num contexto mais ecológico, a preferência por árvores artificiais pode ser motivada pelo desejo de evitar o abate de árvores naturais.

Corridas de São Silvestre e o primeiro banho

Tradicionalmente, as corridas de São Silvestre atraem milhares na noite do dia 31 de dezembro (data que marca o dia da morte do papa Silvestre I), que se despedem do ano a correr. Hoje, decorrem noutros dias do mês de dezembro e de janeiro, conforme as localidades.

A mais antiga de Portugal Continental é a da Amadora, que já vai na sua 48.ª edição, mas a primeira realizou-se na Madeira, em 1958, também conhecida por “Volta à Cidade do Funchal”. 

Esta prova de atletismo, que está quase a comemorar um século de existência, tem origem no Brasil. Em 1925, o jornalista e advogado Cásper Líbero, que havia ficado impressionado com uma corrida noturna que tinha visto em França, quis criar uma corrida semelhante, mas que celebrasse o fim do ano e reunisse pessoas de todas as classes sociais. Desde aí, passou a servir de inspiração para muitas provas que se realizam por todo o mundo.

Se para muitos o ano velho acaba a correr, para outros o novo ano começa a nadar. A tradição do primeiro banho do ano em Portugal remonta a meados do século XX. Diz-se que terá começado em 1942, quando um grupo de amigos audazes decidiu, por brincadeira, tomar um banho de mar na praia de Carcavelos, no concelho de Cascais, para receber o Ano Novo. O grupo foi seguido por outros e o ato (arrepiante) rapidamente se tornou tradição e se espalhou por todo o país. Hoje, o primeiro banho do ano é uma tradição popular no país, especialmente nas praias do litoral. Existem várias superstições associadas a esta prática. Diz-se que dá sorte, saúde e prosperidade e que ajuda a limpar o corpo e a alma dos maus espíritos do ano velho.

Dia de Reis 

É celebrado em muitos países e marca a visita dos magos Gaspar, Belchior e Baltazar ao Menino Jesus. Chegaram a Belém guiados por uma estrela e com presentes simbólicos nos alforges: ouro, a representar a realeza de Cristo; incenso, como símbolo de divindade e de oração; e mirra, que está associada à morte e ao sacrifício, um prenúncio do sofrimento do filho de Deus.

A festa, também conhecida como Epifania, é celebrada a 6 de janeiro, e encerra as celebrações da quadra natalícia com bolo-rei ou bolo-rainha ao som das Janeiras. Aqui ao lado, em Espanha, e noutros países de língua espanhola, é neste dia que acontece a troca de presentes trazidos pelos três reis magos.

Janeiras

Se entre 1 e 6 do primeiro mês do ano ouvir cantar à sua porta “Boas noites, meus senhores, / Boas noites vimos dar, / Vimos pedir as Janeiras, / Se no-las quiserem dar”, isso são a Janeiras. A tradição, iniciada no século XVI, junta grupos de amigos e vizinhos, sem ou com pequenos instrumentos, que se passeiam e cantam pelas ruas de cidades e aldeias, um pouco por todo o país, a desejar um bom ano e a apelar à partilha de alimentos e bebidas.

Tradições Natal

Terá tido origem em costumes pagãos, nomeadamente na celebração do solstício de inverno chamada Saturnália. Era uma época de renovação e esperança para os romanos que a comemoravam em homenagem a deuses como Saturno, que representava a riqueza, a abundância e a renovação, e Janus, o deus das mudanças e das transições, do fim e dos começos.

Missa do Galo e Missa do Parto

A missa da meia-noite do dia 25 de dezembro é celebrada no mundo católico e nos países que falam português e espanhol adotou o nome de Missa do Galo. A sua verdadeira razão desconhece-se, acreditando-se, no entanto, que o seu criador tenha sido o papa Sisto III, que em algum momento do século V a introduziu na liturgia.
No final desta missa, que decorre de norte a sul de Portugal, é costume as pessoas beijarem o Menino Jesus, que é colocado no presépio nessa altura, simbolizando o seu nascimento.

Mais concretamente na Madeira e no Porto Santo destaca-se a Missa do Parto, uma novena, ou seja, é composta por nove missas as quais simbolizam os nove meses de gravidez da Virgem Maria. Estas missas são uma tradição secular, celebram-se de madrugada, a partir das 5h30, com cânticos tradicionais e populares, de 16 de dezembro à véspera de Natal, como preparação para a Missa do Galo, e são seguidas de momentos de convívio com música e iguarias.

As suas origens recuam ao século XVII, altura em que começaram a ser referenciadas em documentos históricos.

Noite de Natal e de Ano Novo

Os povos antigos, nomeadamente os romanos, celebravam o solstício de inverno no hemisfério norte (21 de dezembro) com banquetes e festas, nos quais se consumiam alimentos ricos e saborosos, considerados símbolos de prosperidade e abundância para o ano que se iniciava. Com o advento do cristianismo, essas celebrações inicialmente pagãs passaram a ter uma conotação religiosa ao terem sido associadas pela Igreja ao nascimento de Jesus Cristo, cuja data exacta não é possível determinar. O costume de celebrar o Natal deverá reportar-se ao século IV, altura em que o papa Júlio I terá oficializado a data do nascimento de Jesus no dia 25 de Dezembro. No início faziam-se vigílias e até seriam dias de jejum, com os fiéis reunidos nas igrejas a rezar e a cantar. No fim do jejum seria servida uma refeição leve.
Com o passar do tempo, aos festejos cristãos foram-se juntando tradições pagãs e a ceia de Natal evoluiu desde a era romana até chegar à Consoada tal como a conhecemos na atualidade. A 24 de dezembro, as famílias cumprem o ritual de se reunirem à volta da mesa com iguarias típicas cuja composição varia consoante a região do país.
 

Tradições Natal

De referir que sobretudo no norte de Portugal é hábito guardar-se os lugares dos familiares recentemente desaparecidos, na mesa da Consoada, ou então deixar a mesa posta e o lume aceso durante a noite para reconfortar e aquecer as suas almas.

No interior do país, de Trás-os-Montes ao Alto Alentejo, a Consoada é marcada ainda por mais uma tradição: a apanha, o transporte e a queima do madeiro, que resulta em fogueiras ateadas geralmente no adro da igreja ou noutro local onde a população se reúne depois da Missa do Galo, como forma de comunhão e de fraternidade.

O mês de dezembro não acaba sem outros festejos. A ceia de Ano Novo, cujos primórdios datam também da era romana, tem influências de outros rituais e até de superstições relacionadas com a boa sorte, a felicidade e a prosperidade para o ano que se inicia. Exemplo disso é a tradição de comer 12 passas às 12 badaladas da meia-noite para pedir desejos para cada mês do novo ano, a qual terá sido influenciada por prática espanhola ligada a uvas frescas, ou o uso de uma peça de roupa ou acessório azul por esta cor estar associada à harmonia, à renovação e à proteção contra energias negativas, entretanto afugentadas pelo hábito de fazer muito barulho, batendo tachos e panelas à janela.

Ainda na noite do dia 31, as fogueiras voltam a acender-se para a queima do velho, geralmente simbolizado num boneco de palha, como forma de purificação e de renovação, deixando para trás o passado para começar o novo ano com otimismo e esperança.

Presentes

A tradição da troca de presentes no Natal é um costume muito antigo. A origem é desconhecida, mas existem algumas teorias que a explicam. Uma delas indica que a troca de presentes se baseia igualmente nas festas pagãs da Roma Antiga da Saturnália durante a qual, além dos banquetes servidos, os romanos trocavam presentes entre si. Outra teoria refere que a troca de presentes está relacionada com os Reis Magos e com os presentes que ofereceram a Jesus. Uma terceira teoria diz que a troca de presentes estará ligada a São Nicolau, um bispo do século IV que ficou conhecido por ajudar os necessitados, distribuindo presentes pelas crianças pobres. Este santo terá inspirado a figura do Pai Natal que hoje conhecemos e que foi popularizada por um anúncio da Coca-Cola nos anos 30 do século XX.

Em Portugal, antes as crianças escreviam cartas ao Menino Jesus a pedir presentes e junto do presépio, árvore de Natal ou debaixo da chaminé colocavam um sapatinho ou uma meia que os iria receber. Na manhã do dia de Natal, acordavam e encontravam os presentes. Essas cartas passaram mais tarde a ser enviadas sobretudo ao Pai Natal que, em resposta, chegava às casas de trenó puxado por renas com um grande saco cheio de presentes.

Tradições Natal

Em 1985, os CTT decidiram começar a responder a todas elas (desde que tenham um remetente) e enviar também uma pequena lembrança a cada criança. Esta iniciativa, quase com 40 anos, continua a ser mantida e tem uma particularidade: estas são as únicas cartas que podem circular sem selo. Espera-se que este ano os CTT recebam cerca de 150 mil cartas dirigidas ao Pai Natal, que tipicamente têm como morada do destinatário o “Pólo Norte” ou a “Lapónia”, mas também destinos mais criativos como “A Terra do Frio” ou “O Caminho das Estrelas”.
Algumas famílias continuam a abrir os seus presentes na manhã do dia 25 enquanto outras o fazem à meia-noite, ou seja, no final da Consoada, que dá as boas-vindas ao Natal.

Presépios

O presépio é outra tradição profundamente enraizada no nosso país, desempenhando um papel significativo nas celebrações natalinas. Esta representação do nascimento de Jesus remonta ao século XIII, quando São Francisco de Assis montou o primeiro presépio em Greccio, Itália, em 1223. As principais figuras do presépio são, além dos três elementos da Sagrada Família, os animais, a estrela-guia e os reis magos: Belchior, Gaspar e Baltazar.

Em muitas casas portuguesas, a montagem do presépio, geralmente com figuras de barro, plástico ou outros materiais, é uma atividade familiar apreciada. Reza a tradição que o Menino Jesus só seja colocado na manjedoura à meia-noite do dia 25 e que os Reis Magos só apareçam alguns dias depois.

Muitas autarquias erguem os seus presépios na rua, de que é exemplo a do Sabugal. Esta cidade do distrito da Guarda tem montado aquele que é considerado o maior presépio natural de Portugal e está aberto a visitas até dia 7 de janeiro.

Outras localidades exibem presépios vivos, em que as figuras são pessoas reais. O maior da Europa está em Priscos (Braga). Cerca de 800 participantes dão vida à história da família da Nazaré e recriam o contexto da época em mais de 90 cenários dispersos por um espaço com cerca de 30.000 metros quadrados. A última apresentação decorre no dia 14 de janeiro de 2024.

Tradições Natal

Na tradição madeirense são populares a lapinha e o presépio-lapinha: a escadinha e a rochinha. As primeiras são o tipo mais antigo e constitui uma representação do altar onde o Menino Jesus é enaltecido no cimo do último degrau. A escadinha é geralmente feita de madeira e as figuras são pequenas e delicadas. Já a rochinha é mais recente, sendo uma representação da paisagem da ilha da Madeira, com figuras de tamanho médio ou grande. É, por norma, feita de barro e as figuras são mais detalhadas e coloridas.

Neste mês mágico de dezembro, as tradições unem as gerações, ligando o passado com o presente, em que cada gesto ressoa como um eco de histórias que se contam de ano para ano. Continuemos a reforçar os laços familiares, a abraçar a diversidade e a alimentar a chama da esperança que o novo ano traz consigo.

Boas festas.